Quem é que isola a Rússia?

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62Lisboa não é Ancara e o embaixador Belousov podia ter prevenido atempadamente que não iria comparecer à conferência no Instituto de Defesa Nacional, pois nada aconteceu de excepcional na nossa capital

José Milhazes

Os dirigentes russos não param de acusar todo o mundo de os tentar isolar, mas, frequentemente, são eles ou os seus representantes diplomáticos que não gostam de intervenções públicas.

O Instituto da Defesa Nacional e o Instituto Português de Relações Internacionais da Universidade Nova de Lisboa decidiram, no passado dia 21 de Fevereiro, organizar uma conferência subordinada ao tema “A Federação da Rússia no Sistema Internacional”, em que o keynote speech (discurso principal) deveria ser proferido por Oleg Belous, Embaixador da Federação da Rússia em Portugal.

Não é frequente se poder ouvir intervenções públicas do representante diplomático russo no nosso país, e parece ter sido isso uma das causas da grande afluência de público à conferência.

O jornal ucraniano Evropeiskaia Pravda, citando uma fonte da Embaixada da Ucrânia em Lisboa, relata que “no início da conferência, Vítor Daniel Rodrigues Viana, director do citado instituto, declarou que o principal orador: Oleg Belous, embaixador da Federação da Rússia em Portugal, não iria participar na conferência devido a uma acção de protesto organizada pela comunidade ucraniana em Portugal, à frente do edifício do instituto”.

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Efectivamente, cerca de dez ucranianos juntaram-se Perto da porta do Instituto da Defesa Nacional com cartazes onde se podia ver Putin acompanhado da legenda: “Assassino, deixa a Ucrânia em paz!”, ou : “Três anos de agressão russa contra a Ucrânia. Stop Putin”.

Mas não é nada diplomático privar uma plateia repleta de ouvintes interessados por uma razão claramente inventada para que o embaixador russo não comparecesse. Se fossem dezenas ou centenas de manifestantes enfurecidos, mas eram apenas cerca de 10.

Sei de fonte segura que Moscovo ordenou aos seus diplomatas só saírem dos edifícios das embaixadas e consulados russos no estrangeiro com autorização do embaixador e em caso de forte necessidade. Esta medida foi tomada depois do assassinato de Andrei Karpov, máximo representante diplomático da Rússia na Turquia.

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Essa medida é compreensível, mas não ao ponto do embaixador Belousov recear pela sua segurança. Lisboa não é Ancara e o embaixador Belousov podia ter prevenido atempadamente que não iria comparecer à citada conferência, pois nada aconteceu de excepcional na capital portuguesa, desde o anúncio da conferência até ao acto de abertura, para que se tenha tornado menos segura.

A atitude do embaixador russo mais se assemelha a uma falta de respeito para com aqueles que estavam à sua espera no auditório, até porque, segundo conseguimos apurar, estava combinado que Oleg Belousov não iria responder a perguntas, nem a participar no debate.

Depois, o Kremlin acusa o Ocidente de o tentar isolar, de interpretar tendenciosamente as suas palavras e os seus actos, de denegrir a sua imagem. Teve uma boa oportunidade para esclarecer a elite académica e militar portuguesa sobre as posições políticas do Presidente Vladimir Putin, mas não o quis fazer. É pena.

José Milhazes

Observador

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